Infelizamente não podemos a maioria das vezes acreditar, ou formar opinião, apenas com base no que os nossos meios de comunicação nos trazem. A qualidade geral do jornalismo português, no que tem sido a minha sensibilidade, parece estar efectivamente a baixar. Assim sendo, até porque acredito que enquanto tiver responsabilidades no PLD (sim eu sei que é ainda um micro partido e que sou apenas do Conselho Nacional, mas estas coisas são para levar a sério), devo fundamentar o melhor possivel as minhas opiniões, pelo menos em termos políticos.
Como tal, antes de fazer qualquer julgamento de valor acerca do Projecto de Revisão Constitucional do PSD senti necessidade de o ler, estudar e comparar com o actual texto constitucional e tirar as minhas próprias conclusões. Para tal consultei o site do PSD, onde encontrei o link onde se podia imprimir o dito projecto.
Do que estudei gostaria de deixar aqui algumas considerações pessoais:
- No artigo 7º do Projecto de Revisão Constitucional (daqui por diante PRC) o PSD faz constar como um dos princípios das Relações Internacionais da República a prevenção de conflitos, no que me parece ser uma entrada clara no grupo de países que considera a "guerra preventiva" como um meio de garantir a ordem internacional.
- O PRC inclui entre as tarefas fundamentais do Estado o "Promover a solidariedade entre gerações" - não tenho a certeza da intenção da inclusão desta expressão, mas podemos pensar que é para demissão do papel do Estado, ou que a palavra "solidariedade" não está bem aplicada e que a ideia será mais a de promover um relacionamento e inter relacionamento maior entre gerações - uma delas será, mas qual fica por esclarecer.
- O PRC permite que a lei estabeleça que uma pessoa portadora de doença contagiosa grave, tal como já acontece actualmente em casos de "anomalia psíquica", seja inibida da sua liberdade - percebo que isto poderá ser para fins de evitar a propagação de epidemias, não posso aceitar doutro modo, mas a forma como está no PRC abre porta a abusos, pelo que devia de haver já alguma limitação constitucional, não deixando tudo para a consideração da lei.
- No PRC existe um garantismo que me parece errado pela generalização que faz, porque garante que sempre que haja uma alteração da lei processual penal que agrave a situação de um arguido num processo que já se tenha iniciado antes da aprovação da dita lei, esta não se pode aplicar a esse processo, mas podemos por isso inferir que se a situação se tornar melhor aí já se aplicará a nova lei.
- Uma inovação que me parece positiva no PRC é que existe uma maior descrição dos direitos dos arguidos e dos ofendidos, coisa que no actual texto constitucional não está presente.
- O princípio constitucional da "inviolabilidade do domicílio" é, no PRC, alargado à sede das Pessoas Colectivas, no que me parece ser um claro ganho da liberdade e do direito à privacidade.
- Ao contrário do que consta na actual Cosntituição, o PRC prevê que em casos de flagrante delito, no cometimento de crimes com moldura penal igual ou superior a cinco anos, a polícia possa entrar durante a noite num domicílio - embora concorde com a medida, vejo que existe alguma confusão na forma como a constituição possibilita a entrada nos domicílios pelas autoridades, sobretudo no período nocturno.
- No artigo 38º, n.º 6, do PRC está uma pequenina expressão - "quando exista" - que abre claramente a porta à inexistência de um sector público de comunicação social. A verdade é que a constituição não obriga a que se privatize a RTP, nem a que se extinga o sector de comunicação social do Estado, apenas abre essa possibilidade. Ainda hoje, com algum histerismo, e apenas com o objectivo de lançar a confusão, ouvi na rádio uma personalidade do PS a insurgir-se contra a intenção do PSD de privatizar a RTP. A verdade é que isto é um PRC, não é uma lei de priovatizações. Mas a histeria e a manipulação mentirosa têm sido as armas utilizadas pelo PS nesta discussão. O argumento final deste responsável (creio que foi Arons de Carvalho) era de que por toda a Europa havia sectores públicos de rádio e televisão, que Portugal também teria de ter. Mas a dúvida que me fica sempre é se nesses países essas empresas também são survedouros exageradíssimos de dinheiros públicos e se já se fez, também aí, o debate sobre a real necessidade de manutenção de tal sector.
- A protecção ao emprego consignada na constituição permanece no PRC, mas ao texto actual acrecenta que essa protecção será nos "termos da Carta dos Direitos Fundamentais da UE".
- Como já muito se debateu, no PRC, desaparece a expressão "justa causa" para despedimento, aparece "legalmente atendível" - sinceramente não entendo o cavalo de batalha, nem para o PSD nem para a oposição, porque na verdade, com uma expressão ou outra, nada muda, porque é na lei que se define o que é justa causa, como será na lei que se definirá o que é atendível - ou seja debate de carecas por um pente, às nossas custas é claro.
- Existe no PRC um enriquecimento claro por parte dos trabalhadores nos direitos constitucionalmente garantidos, figurando aí o direito dos trabalhadores "a formação cultural e técnica", a "valorização profissional" e a "carreira", o que não consta do actual texto da Constituição, no que acho ser um enriquecimento bem vindo, mas que sinceramente acho inconsequente.
- Na Constituição actual consta que "os salários gozam de garantias especiais, nos termos da lei", mas no PRC consta apenas que essas garantias especiais são apenas para quando haja cessação da relação laboral - o que isto significa para mim é um mistério, quem puder e souber por favor explique-me.
- No PRC está consignado que as empresas têm responsabilidade social, o que sendo vago, já é um passo na direcção certa.
- É proibido, no PRC, o confisco.
- A saúde, o acesso a cuidados de saúde eo SNS tem sido uma das maiores polémicas que têm rodeado o PRC. Existem apenas duas grandes novidades neste projecto, sendo a primeira delas o desaparecimento da indicação de que o SNS tem de ser "tendencialmente gratuito".
- Em complemento afirma também que o acesso à saúde não pode ser negado a ninguém por motivos económicos (o que na prática acabará por acontecer se o PS nos continuar a levar para o buraco financeiro, conforme tem feito - ver "José Gomes Ferreira: a Bomba Relógio").
- A segunda grande novidade em termos de SNS que encontrei no PRC foi o falar da promoção de uma efectiva liberdade de escolha da unidade de saúde. Claro que eu também vejo a abertura a que um doente do SNS possa ser tratado, a espensas desse SNS, numa unidade privada de saúde, o que não é necessariamente mau, porque o importante, para mim, é que os cuidados sejam prestados e não quem os presta. A minha verdadeira preocupação com o SNS é, para além do seu financiamento, com os cuidados primários de saúde, porque esses não interessam aos privados, mas são essenciais.
- Creio que a Constituição, em relação ao SNS deve dizer apenas que deve haver um sistema que permita a todos os cidadãos, independentemente das suas condições sócio-económicas, o acesso a cuidados de saúde, curativos e profilácticos.
- No PRC o assentuar das preocupações ambientais é bastante evidente.
- A Educação Pré-Escolar é outra das grandes preocupações de todos nós. No PRC desaparece a expressão "sistema público" falando-se apenas da necessidade de se desenvolver um "sistema geral" do Pré-Escolar. É um progresso, porque sabendo que a maior parte da oferta do Pré-Escolar é do ensino privado ou das IPSS's, não se entende que o Estado não conte com essas entidades para a construção de uma efectiva rede de ensino, abrangente e de acesso a todos.
- No PRC a alínea da Constituição que no artigo 74º fala do estabelecer progressivo da gratuiticidade de todos os graus de ensino, simplesmente desaparece, o que me parece ser a solução, em termos do que deve dizer a Constituição, mais adequada, até porque defendo, tal como está inscrito também no PRC a efectiva liberdade de escolha do estabelecimento de ensino.
- No PRC do PSD consta uma pequena revolução na gestão das escolas, porque deixaria, caso fosse aprovado, de estar inscrito na Cosntituição o direito dos Professores e dos alunos de participarem na gestão democrática das escolas. Polémica, sei que é muito polémica, mas a mim parece-me também razoável, bastante razoável. Afinal os bons modelos são para copiar e afinal em que Colégio deste país e até por esse mundo fora, onde há bons resultados de gestão, os professores e os alunos têm de fazer parte da gestão democrática. Olhemos de outra forma, porque é que nos restantes organismos públicos que prestam serviços aos cidadãos (hospitais, repartições e até tribunais) os funcionários e os utentes não têm este previlégio de participar na gestão? Porque é impensável e não é exequível.
- No artigo 80º da Constituição, o PRC, retira que de entre as formas de organização económico-social esteja a propriedade pública dos meios de produção, o que era uma cedência ideológica clara ao socialismo e que tem de ser erradicado em definitivo de uma Cosntituição que deve refletir, isenta de ideologias, todas as tendências de pensamento político dos cidadãos.
- Um aspecto interessante do PRC, que é apenas um promenor, mas está lá, é que de entre as incumbências prioritárias do Estado deixa de constar a correcção das desigualdades derivadas da insularidade das regiões. Será que o Alberto João já leu isto?
- Outra dos cortes radicais com os toques socialistas da actual Constituição é o desaparecimento da expressão "experiências de autogestão".
- Uma das asneiras que encontrei no PRC, porque discordo frontalmente, é que continua a afirmar que uma das funções do sistema fiscal é "uma repartição justa do rendimento e da riqueza". Mas que raio, porque é que os impostos devem servir para isso? Para isso serve o trabalho, certas obrigações legais, mas mais do que para redistribuição, a preocupação deve ser para retribução justa pelo esforço e trabalho efectuado, que é o que muitas vezes falta, mais do que redistribuição.
- O PRC abre a possibilidade constitucional de haver orçamentos plurianuais.
- Outra grande novidade deste PRC é ao nível dos Referendos. Ao contrário da actual Cosntituição, o PRC afirma que deixa de ser obrigatória a participação de pelo menos metade dos recenseados, para que um referendo seja vinculativo. Não sou grande adepto dos referendos, embora considere que em matérias que envovam grandes implicações na organização social e na soberania nacional, este seja um instrumento útil. Claro que o meu medo está sempre nas manipulações políticas que, em vez de informarem os eleitores para que decidam em consciência, procuram impor com mentiras as suas posições. Ainda assim creio que o problema da vinculação tem de ser melhor pensado, porque assim...
Por agora fico por aqui, amanhã tentarei publicar o restante das considerações e a conclusão que retiro deste PRC.
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