Já não é a primeira vez que as opiniões de José Miguel Júdice, habitual cronista do jornal Público das sextas-feiras, vêm de encontro ao meu pensamento pessoal e muito concordantes com aquilo que é também a ideia que o MMS tem defendido e apresentado sobre o sistema político português. Hoje aconteceu de novo: o ex-bastonário da Ordem dos Advogados publicou hoje no referido jornal um texto sobre a renovação do sistema político, com tiros certeiros e críticas correctas ao mesmo, sob o título de "O renovamómetro".
O meu primeiro impulso foi de publicar aqui por integra a crónica, uma vez que o Público não disponibiliza um link, mas decidi por fim publicar aqui apenas trechos.
O sistema partidário português nunca precisou tanto de renovação porque nunca esteve a um nível tão baixo. O episódio recente da lei de financiamento dos partidos (...) surgiu como apenas mais um exemplo do estado de desagregação do sistema que há muito entrou em processo de entropia negativa.
As causas são conhecidas, como já por várias vezes referi. Hoje em dia, os militantes activos dos partidos correspondem aos eleitos por esses partidos para vários escalões políticos, desde as freguesias ao Parlamento. Vivem disso e para isso e, como é evidente, organizam-se para evitar que surjam quaisquer valores novos que venham tentar competir pelos lugares escassos que ocupam.
A única forma de penetrar no sistema - para além de alguns nomes excepcionais que são exibidos nas campanhas eleitorais e para os quais é forçoso abrir algumas vagas - é entrar quase adolescente para as organizações de juventude. Aí podem insinuar-se pelo esforço e pelo trabalho junto de uma figura grada, fazer campanhas, integrar um gabinete autárquico ou nacional, tornar-se políticos profissionalizados antes de terem qualquer profissão. Depois, com alguma sorte e muita intriga, podem ir subindo gradualmente; até porque se abrem sempre algumas vagas, pois a partir de certa idade alguns políticos afastam-se para actividades mais rentáveis para que são contratados devido à notoriedade, aos contactos e à experiência de sobrevivência num mercado muito competitivo.
Estes cursus honorum sem diversidade é muito negativo para o sistema. Por um lado, porque formata um tipo de político que não tem experiência de vida, que vive em circuito fechado, que depende dos chefes e da carreira e, por isso, não tem ou não usa o espírito crítico, não se orienta por valores ou ideologia, mas tão somente pela sua carreira pessoal. Por outro lado, porque não se abre a candidatos à vida política que tenham tido essa atracção mais tarde, quando ou depois de já terem exercido uma actividade profissional. Este outro tipo de candidatos traria diferenciação e novidade ao sistema, no que seria uma espécie de reforço da ecologia política baseada na diversidade e na complementaridade.
(...)
Veja-se o exemplo - que tantas vezes referi sem que até hoje nem um único partido nem um único político alguma vez tenha ousado discordar de mim - do excesso de freguesias e de câmaras municipais, que contribuem para a tragédia do ordenamento do território, para o aumento dos custos do Estado e até para uma cultura de ociosidade política. Não é possível reduzir o número de autarquias porque isso tornaria a luta pelos lugares, mais escassos, ainda mais dura e agressiva; e, evidentemente, os políticos profissionais preferem ter mais lugares para distribuir do que ter de lutar ainda mais por eles.
(...)
A dimensão dos desafios tem de aumentar o sentido de responsabilidade das elites, dos que muito ganharam com 30 anos de democracia e crescimento económico e que pouco ou nada deram ao Colectivo e ao Bem Comum. Existe, por isso, uma janela de oportunidade para a renovação do pessoal político nas próximas eleições legislativas e autárquicas. Espero que os partidos sejam capazes de candidatar (...) mais pessoas com experiência da vida real e que estejam com uma idade em que voltam a ter mais tempo para dedicar a causas sociais e colectivas (...) numa palavra, portugueses que vão para a política para servir e não para se servirem.
(...) Espero até que a Critical Software ou a Y Dreams inventem um renovamómetro que permita medir instantaneamente a renovação, para assim nos ajudarem a escolher em quem votar. E, mais do que isso, nos ajudarem a decidir ir votar.
O meu primeiro impulso foi de publicar aqui por integra a crónica, uma vez que o Público não disponibiliza um link, mas decidi por fim publicar aqui apenas trechos.
O renovamómetro
(...)O sistema partidário português nunca precisou tanto de renovação porque nunca esteve a um nível tão baixo. O episódio recente da lei de financiamento dos partidos (...) surgiu como apenas mais um exemplo do estado de desagregação do sistema que há muito entrou em processo de entropia negativa.
As causas são conhecidas, como já por várias vezes referi. Hoje em dia, os militantes activos dos partidos correspondem aos eleitos por esses partidos para vários escalões políticos, desde as freguesias ao Parlamento. Vivem disso e para isso e, como é evidente, organizam-se para evitar que surjam quaisquer valores novos que venham tentar competir pelos lugares escassos que ocupam.
A única forma de penetrar no sistema - para além de alguns nomes excepcionais que são exibidos nas campanhas eleitorais e para os quais é forçoso abrir algumas vagas - é entrar quase adolescente para as organizações de juventude. Aí podem insinuar-se pelo esforço e pelo trabalho junto de uma figura grada, fazer campanhas, integrar um gabinete autárquico ou nacional, tornar-se políticos profissionalizados antes de terem qualquer profissão. Depois, com alguma sorte e muita intriga, podem ir subindo gradualmente; até porque se abrem sempre algumas vagas, pois a partir de certa idade alguns políticos afastam-se para actividades mais rentáveis para que são contratados devido à notoriedade, aos contactos e à experiência de sobrevivência num mercado muito competitivo.
Estes cursus honorum sem diversidade é muito negativo para o sistema. Por um lado, porque formata um tipo de político que não tem experiência de vida, que vive em circuito fechado, que depende dos chefes e da carreira e, por isso, não tem ou não usa o espírito crítico, não se orienta por valores ou ideologia, mas tão somente pela sua carreira pessoal. Por outro lado, porque não se abre a candidatos à vida política que tenham tido essa atracção mais tarde, quando ou depois de já terem exercido uma actividade profissional. Este outro tipo de candidatos traria diferenciação e novidade ao sistema, no que seria uma espécie de reforço da ecologia política baseada na diversidade e na complementaridade.
(...)
Veja-se o exemplo - que tantas vezes referi sem que até hoje nem um único partido nem um único político alguma vez tenha ousado discordar de mim - do excesso de freguesias e de câmaras municipais, que contribuem para a tragédia do ordenamento do território, para o aumento dos custos do Estado e até para uma cultura de ociosidade política. Não é possível reduzir o número de autarquias porque isso tornaria a luta pelos lugares, mais escassos, ainda mais dura e agressiva; e, evidentemente, os políticos profissionais preferem ter mais lugares para distribuir do que ter de lutar ainda mais por eles.
(...)
A dimensão dos desafios tem de aumentar o sentido de responsabilidade das elites, dos que muito ganharam com 30 anos de democracia e crescimento económico e que pouco ou nada deram ao Colectivo e ao Bem Comum. Existe, por isso, uma janela de oportunidade para a renovação do pessoal político nas próximas eleições legislativas e autárquicas. Espero que os partidos sejam capazes de candidatar (...) mais pessoas com experiência da vida real e que estejam com uma idade em que voltam a ter mais tempo para dedicar a causas sociais e colectivas (...) numa palavra, portugueses que vão para a política para servir e não para se servirem.
(...) Espero até que a Critical Software ou a Y Dreams inventem um renovamómetro que permita medir instantaneamente a renovação, para assim nos ajudarem a escolher em quem votar. E, mais do que isso, nos ajudarem a decidir ir votar.
A oeste nada de novo, especialmente em alguém que se move como peixe (graúdo) na água numa corporação das mais reacionárias e fixistas que alguma vez existiram. Talvez se tivesse feito o trabalho de casa antes de vir anunciar a alvorada, lhe fosse concedido algum mérito. É assim pouco importante quanto a mim, que se destaque esta espécie tardia de clarividência, apenas e talvez, porque vem de alguém conhecido, e quando tanta Vox Pop há muito o fez, com mais propriedade e experiência real de Vida. Há que deixar cair este sentimento de orfandade perante as figuras públicas, já vimos do que são capazes e do quanto lhes devemos. Ou serão elas a nós..?!
ResponderEliminarCaro João Carlos
ResponderEliminarPercebo perfeitamente o que diz. A clarividência de que falo é quase um suspiro, uma exclamação de como este senhor que, como diz, se move, e com muito proveito próprio, entre as corporações, diz estas coisas completamente anti-sistema; e não é a primeira vez que o faz. Não é um sentimento de orfandade perante figuras públicas, mas sim a constatação de haver alguém, com acesso à comunicação social, que diz as mesmas coisas que pessoas anónimas como eu dizem, contra o sistema partidocrático em que vivemos.