domingo, 10 de maio de 2009

Políticas de inclusão social: microcrédito, imigração, RSI - uma resposta

Após um comentário meu deixado no blogue do caro Carlos Santos, O Valor das Ideias, sobre uma crítica às posições ideologicamente preconceituosas de direita e de esquerda, este teve a amabilidade de escrever um novo post onde concretizava uma das minhas críticas, que era o facto de se utilizar constantemente o termo "políticas de inclusão social", como um termo vago e sem concretização. Ora no texto em questão, Carlos Santos apresenta-me três medidas que acha serem exemplos eficazes de medidas de inclusão social. Tudo isto a propósito dos problemas ocorridos no Bairro da Bela Vista, em Setúbal.
A primeira medida apresentada foi o Microcrédito. Apesar de todas as possíveis objecções de direita ou de esquerda que se podem levantar, o microcrédito sempre me pareceu uma medida de excelente resultado para a inclusão de pessoas em risco de exclusão social. Não posso concordar mais com o dito por Carlos Santos (não sei se a medida é de direita ou esquerda, porque não me revejo nessas divisões, sei que é boa e por isso subscrevo-a). Claro que existe uma intervenção do Estado para garantir a bonificação que torna viável todo o pequeno negócio assim originado, mas creio que aqui ninguém, nem mesmo o liberal mais cego, pode discordar desta medida, porque o Estado intervém no mercado, mas não como actor, apenas como catalisador, numa medida que, sendo de índole social, produz mercado, produz negócio, produz riqueza. Não se pode dizer o mesmo de tantas outras medidas de estímulo económico. Se alguém diz que os mercados se auto-regulam, mesmo depois do que aconteceu nos mercados financeiros mundiais é completamente cego, e só pode estar tapado por uma negra nuvem de preconceito ideológico. Mas isso não acontece comigo. Esta medida é boa, o Estado intervém no mínimo, todo o resto é um esforço da sociedade civil. Apesar de esta ser fraca em Portugal, conforme disse Carlos Santos, foi através das associações de bairros e de emigrantes que se conseguiu entrar nos bairros e tentar levar o microcrédito ao conhecimento de mais pessoas. O que me mete medo é que certos sectores da esquerda, como ouvi na sessão solene do 25 de Abril, a Ana Drago a dizer, que a sociedade civil é apenas mais uma das capas do sector privado, desejando anular totalmente a intervenção desta em favor da intervenção estatal. E isto preocupa-me porque o Estado não deve estar em todo o lado e fazer tudo. No microcrédito o Estado garante a fluidez desta medida, que sendo eminentemente social, redunda na criação de riqueza e não numa dependência continuada do Estado.
A segunda medida apresentada por Carlos Santos foi a valorização do capital humano proveniente das migrações. É apresentado o caso de uma série de emigrantes de leste, que sendo de elevado potencial, por terem elevadas qualificações, têm grande dificuldade em se integrarem profissionalmente devido a uma série de factores: a dificuldade na integração linguística, a dificuldade na certificação profissional, a dificuldade em ultrapassar o preconceito de que estes emigrantes aceitam fazer trabalhos de qualificação mais baixa e de baixo salário que os portugueses já não aceitam fazer. Nesta questão eu gostaria mais uma vez de fazer sentir a necessidade de uma sociedade civil mais forte. E aqui culpo o Estado. Se a nossa sociedade civil, as nossas associações, as nossas IPSS´s, tivessem uma maior capacidade de intervenção, com uma coordenação eficaz e quase mínima de uma entidade pública (autarquia ou segurança social), muitos destes problemas seriam eficaz e rapidamente ultrapassados. Aliás as primeiras iniciativas de integração profissional de emigrantes qualificados vieram precisamente de sectores da sociedade civil, associações e instituições ligadas à Igreja Católica. Mas eu culpo o Estado. Atenção que digo o Estado, não digo governos ou partidos, porque muito sinceramente, os partidos tradicionais são todos muitos parecidos. Porque é que culpo o Estado? Porque em Portugal o Estado abafa as associações e as instituições. Sim abafa porque não concebe que uma IPSS possa sobreviver sem apoio estatal; porque o Estado absorve, via fiscal, tanta da riqueza produzida (que se perde na engrenagem estatal, pelo que nunca é reinvestido) que pouco ou nada sobra para a sociedade civil intervir; porque as leis do mecenato, em particular do mecenato social são tão limitadas que as empresas encontram pouco estímulo em colaborar; porque (por muito que os sectores mais radicais da direita não gostem), as IPSS's deveriam ser isentas de fazer descontos para a segurança social, assumindo o Estado essa despesa; porque o Estado ao programar bairros para reinserção social deveria de os planear já com espaços de intervenção social, que dispensaria a entidades privadas; porque mesmo nas novas urbanizações deveriam sempre ter estes aspectos em conta.
Aqui gostaria de fazer uma pausa para comentar uma frase de Carlos Santos, quando fala no "desafio da produtividade". Embora não tenha muito a ver com a questão eu gostaria de ressalvar que em Portugal existe de facto um problema grave de produtividade. Cheguei a esta conclusão por experiência própria - trabalhei dez anos, atenção que não foram dez dias, nem dez meses, foram dez anos na Autoeuropa, uma empresa exemplar, em termos de produtividade, mas sobretudo de gestão, a nível internacional, dentro do próprio grupo Volkswagem. Aprendi algumas coisas sobre produtividade. Em primeiro lugar a produtividade é um problema de capacidade e cultura de gestão. Bons gestores, que conseguem formar as suas equipas e motivá-las conseguem empresas mais produtivas. Em segundo lugar a produtividade alcança-se por uma organização extrema, flexível numas coisas, intransigente noutras, como por exemplo na organização, arrumação, limpeza, postura, formação contínua, melhoramento contínuo, etc. Em terceiro lugar a produtividade é alcançada com uma mudança de mentalidades, que deve ser produzida pela empresa, nos trabalhadores. O trabalhador português é em geral pouco pontual e pouco assíduo. Na Autoeuropa não é assim e isso deve-se a uma profunda mentalidade cultivada pela empresa e a um elevado sentido de equipa, que também é cultivado. E isto, acompanhado por métodos de continua inovação tecnológica, contínuo melhoramento e sempre colocar em causa todo o processo, procurando ver onde este pode ser melhorado são as chaves para se conseguir vencer o "desafio da produtividade".
Por fim, o caríssimo Carlos Santos fala, como uma importante medida de integração social, o Rendimento Mínimo de Inserção. E aqui as nossas visões são antagónicas. Eu nunca fiz pesquisas académicas sobre estas questões, mas fiz trabalho voluntário com pessoas socialmente excluídas. Se houve algo que aprendi é que, estando numa situação de dificuldade, uma pessoa que obtenha uma pequena ajuda destas, entra numa espiral de degradação, encostando-se a esse lugar de refúgio, não procurando uma melhoria, nem uma independência do sistema, sempre com o medo de alguma altura perderem o direito a essa ajuda. Além do mais, da minha experiência prática, e tendo em conta o que acabei de dizer, o RSI tem exactamente o efeito oposto, vai apenas isolar e excluir cada vez mais as pessoas de uma integração social plena. A grande prova é que os casos de sucesso são ínfimos, dada a dimensão da ajuda. Não se trata de deitar fora o bebé com a água, o problema é que estamos a colocar tanta água que acabamos por afogar o bebé. Atenção que não sou contra um imobilismo cínico do Estado que tenho lido em alguns blogues de direita, mas também não sou a favor deste intervencionismo irracional do Estado. No meu ponto de vista o RSI deveria ser canalizado para IPSS's que no local, sendo mais conhecedoras das realidades, distribuíam as ajudas. Estas deveriam ter sempre um tempo limitado, afim de estimular os beneficiários a tornarem-se autónomos. Por outro lado, as ajudas deveriam sempre implicar o apoio activo na procura de emprego. Eu sei que parece difícil, mas existe tanto potencial, tantas instituições que poderiam fazer este trabalho, com muito mais proximidade, eficácia e correcção, do que aquilo que o Estado consegue. Pelo que vê não me preocupo com o que o Estado gasta aqui, só me preocupa que o gaste mal. Aliás, em tom de conclusão, gostaria de deixar esta observação: que provavelmente era muito melhor para a economia que o governo, em vez de continuar a distribuir alguns milhões sobre tudo o que mexe, reintroduzi-se de novo a bonificação de juros nos créditos à habitação.
A pensar hem.

2 comentários:

  1. Totalmente off topic: precisamos neste país de um partido liberal com forte cariz conservador, que se distinga claramente de todos os que já temos, que navegam em águas turvas. Sem cedências...

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  2. Não me parece que um partido liberal. no sentido puro e duro seja a solução para Portugal, da mesma maneira que um partido de esquerda, ou mesmo de centro, o seja também. A minha visão de Portugal envolve mais um partido moderno, que sem se deixar prender nas malhas de ideologias velhas, ocas e esbatidas, procura pelas melhores soluções para uma maior qualidade de vida no país.

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